Portaria MTE nº 3.665/2023 e os Novos Paradigmas para o Trabalho em Feriados no Comércio
Por Nicole Sthefany Neves de Souza e Clarissa Mello
A dinâmica das relações trabalhistas no Brasil está em constante evolução, impulsionada por novas demandas sociais e econômicas. Nesse contexto, após três postergações, passarão a vigorar, a partir de 1º de julho de 2025, as novas exigências instituídas através da Portaria MTE nº 3.665/2023 que alteram a dinâmica do trabalho em feriados nas atividades comerciais.
A Portaria MTE nº 3.665/2023 emerge como um marco regulatório de grande impacto para o setor do comércio, ao alterar substancialmente as regras para o trabalho em feriados. Este artigo tem como objetivo analisar os principais aspectos da referida portaria, seus fundamentos legais e as possíveis consequências para empregadores e empregados do setor.
Publicada em 13 de novembro de 2023, a referida altera a Portaria/MTP nº 671/2021, revogando diversos subitens do item II (Comércio) do Anexo IV desta última. A principal mudança reside na revogação dos subitens que permitiam o trabalho em feriados com base em acordos individuais.
A nova portaria encontra respaldo no art. 6º-A da Lei nº 10.101/2000, que, alterada pela Lei nº 11.603/2007, condiciona o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, à prévia autorização em convenção coletiva de trabalho, observada a legislação municipal.
A principal consequência da Portaria MTE nº 3.665/2023 é a necessidade de negociação coletiva para autorizar o trabalho em feriados no setor de comércio. As empresas não poderão mais se basear em acordos individuais para convocar seus funcionários para o trabalho nesses dias, sob pena de descumprimento da legislação trabalhista.
É importante ressaltar que a portaria não altera as regras de remuneração para o trabalho em feriados. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê que o empregado que trabalhar em feriado tem direito a receber o pagamento em dobro ou à concessão de folga compensatória, a ser usufruída em prazo razoável.
A nova portaria revoga as autorizações permanentes anteriormente concedidas pela Portaria nº 671/2021 para o funcionamento de atividades comerciais em domingos e feriados, afetando setores como supermercados, açougues, farmácias, comércio varejista em geral, entre outros, que dependem da operação contínua.
Mas é importante destacar que a portaria não afetará os serviços ditos essenciais, como, restaurantes, bares, postos de combustíveis, hotéis, padarias, entre outros, bem como, mantém a permissão de funcionamento das feiras livres aos domingos e feriados sem a necessidade de negociações coletivas.
Segundo a referida Portaria, a convenção coletiva deverá estabelecer as regras para o trabalho em feriados, como a forma de compensação, o pagamento de adicionais e as condições de segurança e saúde no trabalho.
Apesar de implicar em maior participação dos Sindicatos, a norma pode trazer maior burocracia e dificuldade de estabelecer a dinâmica do trabalho em feriados para setor econômico que tem alta demanda de funcionamento em feriados para o atendimento concreto da população.
O setor encontra-se preocupado com tal alteração legislativa que, aparentemente, vem na contramão da modernização das normas trabalhistas. Isso porque quanto mais os anos passam, mais a realidade de consumo da população nos mostra a necessidade de funcionamento de estabelecimentos de diversos setores em feriados para estimular o consumo e os resultados econômicos do país.
A exigência de negociação coletiva também é vista com ressalvas pelas empresas do setor do comércio, já que, muito provavelmente, pode levar a um aumento dos custos operacionais. Certamente as empresas precisarão investir tempo e recursos em negociações com sindicatos, que possivelmente resultará em acordos com pagamento de adicionais e/ou benefícios aos empregados aumentando o custo da operação e até mesmo inviabilizando para algumas empresas menores do setor.
A preocupação se dá em torno do fato de que substituir a autorização mediante acordo individual — mais célere, menos burocrática e mais efetiva — pode significar um retrocesso para o setor.
Apesar de ser necessário zelar pela saúde dos trabalhadores e preservar a busca pelo trabalho sem jornadas extenuantes, considerando a possibilidade de compensação de jornada pelo trabalho em feriados e ainda a remuneração diferenciada prevista em lei, impor barreiras para o funcionamento das empresas do setor do comércio em feriados não coaduna com a sistemática do mundo globalizado e capitalista em que vivemos.
Não é demais lembrar que a economia brasileira e mundial tem sofrido consequências após a pandemia, e o estímulo ao comércio se faz necessário para manter padrões de consumo e de circulação de renda na nossa sociedade. Portanto, o funcionamento do comércio em feriados se trata de estímulo ao consumo e ao fortalecimento da economia, gerando, de forma reflexa, o aumento de circulação monetária e estimula o mercado de trabalho.
As empresas do setor devem estar atentas às novas regras e buscar o diálogo com os sindicatos para estabelecer condições de trabalho adequadas, bem como os sindicatos também devem sopesar a necessidade da população de atendimento pelo setor do comércio, sendo que grande parte da população somente consegue ter acesso a realizar compras em seus momentos de descanso e lazer, entre eles o próprio feriado.
Assim, a implementação efetiva da portaria exigirá um esforço conjunto de empregadores, empregados e sindicatos, visando a construção de condições mais equilibradas de trabalho e que não afetem a economia e a necessidade da população consumidora.
A portaria exige, também, o cumprimento das leis municipais que regulam o funcionamento do comércio em domingos e feriados, o que adiciona uma camada de complexidade para empresas com operações em diferentes cidades. Cada município pode ter regulamentações específicas, exigindo um acompanhamento jurídico constante e adaptações operacionais.
Considerando que a entrada em vigor da Portaria MTE nº 3.665/2023 ocorrerá em julho do corrente ano, em breve será possível observar os impactos concretos da alteração normativa e avaliar se as mudanças promovidas trarão efeitos positivos ou negativos para o setor.
